quinta-feira, 21 de maio de 2009

Teletransporte

(Bom, nesses últimos tempos estou passando por uma estiagem de inspiração e tempo para escrever, então estou postando aqui um poema antigo que fiz)


Bípedes se movem para o transporte na estação
Se encocham, se encostam, se esfregam,
Se atropelam atravessando a porteira estreita
Se amontoam
Empoleirados em seus quadrados de 30 centímetros
Se esbarram, timidamente.

Os machos devoram com os olhos
Coxas, peitos, rabos.
As fêmeas tentam se preservar
Umas se escondem, outras tentam se mostrar

Olham para o chão, para os lados
Ou qualquer direção.
Através da cerca, do curral, do horizonte,
Enxergam mortamente o nada,
Mesmo sem terem sido abatidos ainda...
Fora do curral tudo é matadouro

Por alguns segundos o transporte pára.
Entram bípedes, saem bípedes... se amontoam,
Se empoleram... é o rodízio.
Um apito sinaliza o fechamento da porteira
O transporte anda.

Todo rodízio é igual
Mais bípedes, menos bípedes, peitos, coxas, rabos,
Rugas, espinhas, fones, bolsas, doenças, sujeira,
Carne, propaganda. Janelas...
Tudo vazio

O calor, o aperto, o desconforto...
Nada disso encomoda.
Caleijamento mental
C O T I D I A N A M E N T E

O transporte pára.
Os bípedes se movem novamente
A viagem termina, e tudo o que se passou
entre o ponto de partida e o ponto de chegada
foi um piscar de olhos,
como um teletransporte.

Enjaulados nascem e são abatidos,
embalados e rotulados
nos supermercados são vendidos
Bípedes depenados, vestidos.
E entre o início e o fim do processo,
um piscar de olhos de vidro
secos e opacos
C O T I D I A N A M E N T E
Como as janelas do metrô.

Um comentário:

  1. e sou obrigado a repetir algo de CHICO qeu anda ecoando aqui na cabeça de ontem pra hoje...
    "Deus lhe pague".

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